segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Capoeira Luandaê Entrevista: Mestre Toni Vargas!

 

Antônio César de Vargas, o Mestre Toni Vargas, nasceu no Rio de Janeiro em 5 de abril de 1958 e a fusão de sua própria vida com a capoeira começou em 1968 com o Mestre Rony do Grupo Palmares de Capoeira. Depois foi aluno de Mestre Touro, do Grupo Corda Bamba e em 1977, ingressou no Grupo Senzala de Mestre Peixinho se formando em 1985. Graduado em Educação Física e pós graduado em dança, Mestre Toni Vargas foi um dos pioneiros no trabalho de capoeira infantil no Rio de Janeiro. Uma importante referência na música da capoeira, já possui notável discografia considerando as dificuldades encontradas em qualquer segmento musical no Brasil. Álbuns como Liberdade, Saudade, Os fundamentos da Malícia (com Mestre Nestor) e Quadras e Corridos são verdadeiros retratos da alma de um homem que costuma dizer que a capoeira se confunde com sua própria vida. Durante a última Clínica de Capoeira realizada na USP por Mestre Gladson, Mestre Toni Vargas, gentilmente concedeu uma breve entrevista a Capoeira Luandaê. (Por Marcos Oliveira).


CL: Como foi seu primeiro contato com a capoeira?
M. Toni Vagas: Eu conheci a capoeira através de um primo que tinha acabado de iniciar na capoeira. Ele me levou pra assistir uma aula e eu simplesmente me encantei completamente já em meu primeiro contato com ela.
 
CL: Quem são seus maiores ídolos na capoeira?
Mestre Toni Vargas com Mestre Peixinho
M. Toni Vagas: Pois é, existem muitas pessoas que a gente se inspira na capoeira e é claro que Mestre Pastinha e Mestre Bimba são ídolos e referências para todos os capoeiristas. Mas Mestre Peixinho é meu grande ídolo. Ele foi uma pessoa que me deu grandes exemplos de caráter, bondade, generosidade e conhecimento dos fundamentos da capoeira. Mestre Peixinho, sem dúvida nenhuma é e vai ser pra sempre meu grande ídolo.


"...Ele (Mestre Peixinho) foi uma pessoa que me deu grandes exemplos de caráter, bondade, generosidade e conhecimento dos fundamentos da capoeira."

 
CL: Considerando toda sua experiência na capoeira e as mudanças que ela vem sofrendo, como o senhor vê a capoeira de hoje?
Grande encontro de capoeiristas

M. Toni Vagas: Eu acho que a capoeira está novamente em uma fase de mudança e é muito difícil definir algo que está em mutação, mas de qualquer forma eu vejo a fase atual com muito otimismo. Os grandes encontros estão voltando a acontecer no Brasil, e, sem dúvida nenhuma, as pessoas estão deixando de lado a questão de brigas e disputas para dar lugar a alegria e a emoção de simplesmente jogar capoeira fazendo dela um instrumento de paz e conhecimento. Eu estou muito otimista com o atual momento da capoeira. Por outro lado, a capoeira está entrando em uma nova fase em que os capoeiristas serão mais cobrados. Mas não no sentido de performance e sim em termos de conhecimento, atitude e postura.



CL: Aproveitando o que o senhor acabou de falar, na sua opinião, como seria um capoeirista completo?
M. Toni Vagas: Eu acho que o capoeirista completo não existe. O conceito criado nos anos 90 de um capoeirista completo (o cara que joga, que toca e canta) é, na minha opinião, totalmente equivocado. O próprio ser humano é falível e na prática da capoeira isso não é diferente. Agora, existem capoeiristas que podem complementar determinadas situações porque tem habilidades específicas para aquele momento. Todo capoeirista que se acha completo não está bem. O capoeirista de verdade deve estar sempre em busca de conhecimento, dos fundamentos da capoeira.


"... O capoeirista de verdade deve estar sempre em busca de conhecimento, dos fundamentos da capoeira."
 

CL: Devido à proximidade do jogos do Rio de Janeiro em 2016, a capoeira como esporte olímpico é um assunto que voltou a ser discutido. Qual é sua opinião sobre isso?
M. Toni Vagas: Eu quero deixar bem claro que tenho profundo respeito pelas pessoas que pensam de outra forma, mas não sou a favor da capoeira como esporte olímpico. Primeiro porque não acredito no modelo das olimpíadas. Esse é um movimento que não me sensibiliza porque coloca a performance muito além do ser humano. Eu sou educador e acredito que o ser humano está acima de sua performance, priorizo sim, o processo de desenvolvimento pleno dos indivíduos. Então, eu não acredito nas olimpíadas como um movimento humanitário e não gostaria de ver a capoeira envolvida. A capoeira tem caminhos muito mais ricos através da cultura e da arte. 
 
CL: Capoeira Angola e Capoeira Regional. Qual é seu ponto de vista?
M. Toni Vagas: Bom, eu costumo brincar que essa é uma divisão soteropolitana, uma divisão que costuma acontecer em Salvador onde surgiram os dois grandes ícones da capoeira: Mestre Bimba e Mestre Pastinha. Eu sou do Rio de Janeiro onde isso originalmente não aconteceu, então eu prefiro não entrar nesse mérito de Capoeira Angola e Capoeira Regional. Eu respeito as pessoas que fazem uma leitura da capoeira a partir da Capoeira Angola ou a partir da Regional, mas não me considero dentro desta divisão.


CL:- Afinal, todos nós bebemos da mesma água, não é Mestre?
M. Toni Vagas: Sem dúvida nenhuma. Eu acredito na capoeira como uma família cósmica e que precisamos pensá-la como um todo. Eu acredito e trabalho nessa direção.


CL: Hoje o Mestre Toni Vargas é uma das maiores referências na música
da capoeira. Como se dá o seu processo de criação de uma cantiga?



M. Toni Vagas: Olha, em geral esse é um processo absolutamente instintivo. Alguma coisa ou ideia que me vem à cabeça me trazendo o desejo de externá-la sem a necessidade uma preparação específica. Muitas vezes crio fora da roda e outras vezes vai saindo ao vivo direto no axé do ritual. Na verdade é uma benção que não me canso de agradecer. CL

 

 

 

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Capoeira Luandaê Entrevista: Mestre Itapoan - 50 anos dedicados à Capoeira!


Raimundo Cesar Alves de Almeida, o Mestre Itapoan, iniciou sua trajetória na capoeira em 1964 na academia de Mestre Bimba. Contemporâneo de outros grandes representantes da capoeira regional como Mestre Camisa Roxa, Acordeon e Airton Onça, Mestre Itapoan também é cirurgião dentista e professor adjunto da UFBA (Universidade Federal da Bahia).
Em 1972, fundou a Ginga Associação de Capoeira e ao longo destes 50 anos de dedicação a capoeira, Mestre Itapoan publicou livros como “Bimba, o perfil do Mestre”, “A Bibliografia da Capoeira Regional, a “Saga do Mestre Bimba”.
Durante a última Clinica de Capoeira realizada na USP por Mestre Gladson, Mestre Itapoan, gentilmente concedeu uma breve entrevista a Capoeira Luandaê. (Por Marcos Oliveira)
 





CL: Como foi seu primeiro contato com a Capoeira?
Mestre Itapoan e Rico 1965 em Itapoã
Mestre Itapoan: Bom, meu pai trabalhava na Petrobras e por isso sempre nos mudávamos quando ele era transferido. Após sua morte, em 1963, nós voltamos pra Salvador e fomos morar em Itapoã. Naquela época, eu tinha um amigo que treinava judô e ele me convidou pra treinar com ele. Então, eu conversei com minha mãe e ela me deu o dinheiro para as aulas de Judô. Mas ao mesmo tempo, um primo meu apelidado Detetive, me chamou pra ver uma aula de Capoeira. Eu nunca tinha visto Capoeira e nem mesmo sabia o que era um berimbau. Eu não tinha a mínima ideia do que era. Mas eu resolvi ir ver a tal aula de Capoeira com ele. Ele me levou na academia de Mestre Bimba. Eu assisti a aula, gostei, peguei o dinheiro do judô e me matriculei.


CL: Quem são seus maiores ídolos na Capoeira?



Mestre Itapoan e Camisa Roxa
Mestre Itapoan: São muitos. Quando eu cheguei na academia de Mestre Bimba, lá já estavam o Acordeom, que já era formado, o Camisa Roxa, o Airton Onça e outros caras. Então, além de Mestre Bimba, eu me espelhei bastante neles. Também na Capoeira angola uma referência que eu tive foi Paulo dos Anjos. Ele morava em Itapoã também e por isso estava sempre na minha casa. Eu tinha outros amigos angoleiros também, mas Paulo dos Anjos foi o mais chegado.



CL: Como o Sr. vê a Capoeira de hoje?
Mestre Itapoan: A Capoeira cresceu tanto no mundo inteiro que é praticamente impossível estabelecer um parâmetro do que é a Capoeira em cada lugar. Há lugares onde pessoas ensinam a Capoeira de um jeito e outros onde ela é ensinada de forma totalmente diferente. É exatamente essa diversidade que faz a Capoeira ser tão fascinante.

CL: Como seria um capoeirista completo?
Mestre Itapoan: Como a Capoeira é uma atividade individual, eu nunca comparo capoeiristas. Uma coisa legal que eu sempre digo e inclusive botei em uma música minha é o seguinte: ‘Hoje o bom foi você, amanhã eu já não sei. O tempo é que vai dizer.’ Então, um capoeirista pode se destacar hoje mas amanhã é outro dia e um outro muito melhor pode aparecer.
Mestre João Grande e Mestre Itapoan em NY.
Agora para ser um bom capoeirista, o cara tem que entender a Capoeira, treinar é importante, mas tem que principalmente pesquisar a Capoeira, buscar informações com Mestres mais antigos e então passar adiante os fundamentos corretos evitando que deturpem a arte da Capoeira.



CL: Quais são suas expectativas para a Capoeira no futuro?
Eu acho que o processo de crescimento da Capoeira é irreversível. Antigamente, agente contava nos dedos os países onde se praticava Capoeira. 

"...as únicas instituições que o capoeirista acredita são os grupos criados e dirigidos por eles mesmos. "
  
Hoje é mais fácil contar onde não tem. Com o crescimento e organização dos grupos é possível chegar a um país e encontrar até 10 grupos diferentes com trabalhos muito bons. Então, eu penso que não tem mais volta. Pra você ver que a coisa é tão louca, aqui mesmo no Brasil, a Capoeira está tão inflamada que acontecem tantos eventos ao mesmo tempo que você não consegue acompanhar. As vezes você é obrigado a declinar convites de grandes amigos e parceiros porque são muitos os convites.
O caminho da Capoeira é esse e ela ainda tem muito a conquistar. Para isso é preciso que os capoeiristas continuem se organizando, se organizando sem instituições, pois as únicas instituições que o capoeirista acredita são os grupos criados e dirigidos por eles mesmos.

CL: Já que o Sr. falou de organização e instituições, o que Sr. pensa da possibilidade da Capoeira ser um dia um esporte olímpico?
Mestre Itapoan e Acordeon Campeonato Baiano de capoeira 1976
Mestre Itapoan: Eu sinceramente espero que a Capoeira nunca seja uma modalidade olímpica. Primeiro que não vai ser Capoeira. Vai ser qualquer coisa parecida com a Capoeira e sem essência nenhuma. Não é possível encaixá-la nas olimpíadas como ela é. A Capoeira é uma coisa muito maior. Um atleta não pode ser avaliado por meia dúzia de golpes. Eu estou lhe dizendo isso porque eu mesmo já disputei competições. Eu disputei os campeonatos de Mestre Bimba, fui campeão universitário, fui campeão Baiano, fui penta campeão baiano pela minha academia. Então, eu vivi tudo isso de perto e posso dizer com certeza que isso não acrescenta coisa nenhuma.

CL: O Sr. mencionou o Mestre Paulo dos Anjos que era um angoleiro e o Sr. vem da Capoeira regional de Mestre Bimba. Capoeira Reginal e Capoeira Angola, qual é seu ponto de vista?
Mestre Itapoan: Olha, se você me perguntar qual é a melhor, eu vou dizer que é a Regional (risos). Mas isso é uma coisa do tipo, você é Vasco eu sou Flamengo, qual é o melhor time, o seu é o seu e o meu é o meu! Então com Mestre e Bimba e Mestre Pastinha era assim. Pastinha dizia que a melhor era Capoeira Angola e Bimba dizia que era a Regional. Mas eu acho que se você praticar qualquer uma das duas com seriedade, você vai ter bom desempenho. Acho inclusive que uma completa a outra.
Lá na Bahia, existe muito essa divisão. Em outros estados, misturam as duas e em alguns casos até chamam essa mistura de Capoeira contemporânea, o que eu acho um erro porque contemporâneo significa tempo e não estilo.

De pé, Mestre Jose Gato, Camisa, Caiçara, Joao Pequeno, Canjiquinha. Agachados, Mestre John Grandão, de Teresina e Mestre Itapoan.
CL: Como era a convivência do Mestre Bimba com seus alunos?
Mestre Itapoan: Não era muito diferente. Hoje você tem alunos que você confia e alunos que você não gosta muito, mas tem que aturar porque o cara tá pagando e isso faz parte do processo. Com meu Mestre era a mesma coisa. 

"Uma coisa admirável sobre Mestre Bimba era o carisma e a facilidade com que ele fazia você, entender, amar e defender a Capoeira"

 Com os alunos que ele se dava bem ele brincava, tentava ser legal, mas os que ele não era muito chegado tinham a mesma aula. Mestre Bimba dava a mesma aula pra todos os alunos. Com isso ele não fazia diferença.
Mestre Bimba era uma pessoa primária, dura, ignorante e bruto, mas ao mesmo tempo uma pessoa muito amável e muito protetora. O Mestre sempre queria o bem do aluno dele.
Mestre Bimba e alunos na Formatura de Xaréu, em baixo no centro Cesar Itapoan
Pra você ter uma ideia, o Mestre Bimba naquela época já tinha 64 anos, ou seja, ele tinha a idade que eu tenho hoje e dava aula às 5 da manhã, no período da tarde e da noite. Eu nunca vi Mestre Bimba faltar em uma aula sequer. Ele realmente tratava seus compromissos com a Capoeira com muita seriedade.
Uma coisa admirável sobre Mestre Bimba era o carisma e a facilidade com que ele fazia você, entender, amar e defender a Capoeira. Se ele pedisse para um aluno pular de cabeça no chão, o aluno pulava. Hoje se eu disser pra um aluno pular de cabeça, ele certamente vai dizer: Pule você!
O que eu posso dizer é que a relação e influência que Mestre Bimba exercia em seus alunos era fantástica. CL

quinta-feira, 30 de maio de 2013



 A Virada Cultural Paulista também terá a contribuição da Capoeira Regional. O evento acontecerá no próximo dia 9 de Junho às 9:00 no Parque Celso Daniel (Av. Dom Pedro II, 940, Jardim - Santo André). Além da roda da capoeira e apresentação da orquestra de berimbaus, o público presente será convidado a participar do Maculelê.



Fique ligado! Em breve, publicaremos um série de entrevistas que alguns dos maiores Mestres da atualidade concederam ao capoeiraluandae.blogspot com exclusividade.