quinta-feira, 26 de novembro de 2009

A história da Capoeira Paulistana


Por Erika Alexandra Balbino

São Paulo, capital cosmopolita e cultural do país, tem sempre um lugar tímido quando se fala em cultura regional. Pouco se discute, até mesmo entre os próprios paulistanos, sobre o choro, o samba regional, os abolicionistas de Santos e São Vicente, as congadas e tantas outras manifestações populares.

A cultura negra, através dos anos, mesmo numa capital como São Paulo, metrópole, esmagadora de minorias, e de culturas subalternas, a capoeira deixou sua marca. Dos escravos aos estivadores do porto de Santos que subiam a serra pra jogar tiririca no Largo da Banana, hoje Barra Funda. Dos sambistas do Bexiga, onde morava o temido apitador Pato n`Água, exímio jogador de tiririca, aos professores de capoeira que trabalham como educadores da Febem, instituição para menores da cidade. Os grandes baianos, hoje também paulistanos que difundiram a cultura de seu estado por onde passaram.

São Paulo e capoeira? Sim, São Paulo seria talvez a última cidade que poderia servir como referência para um resenha sobre capoeira, mas é justamente por esse prisma novo, que traremos um rico trabalho histórico de como era a vida escrava na capital, seus hábitos e costumes, as lutas regionais, a capoeira, a influência da capoeira no futebol, a chegada da Luta Regional Baiana de Mestre Bimba à São Paulo, e a participação de grandes sambistas na construção da capoeira local, e a influência da cultura baiana na capital.

A metrópole que não relata com riqueza as suas tradições, sempre foi pano de fundo para os inúmeros anônimos que fizeram a história da negritude na capital. Os arraiais, as periferias, os negros escravos, os açoites para punir aqueles que ousavam praticar a luta de escravos em vias públicas. Do período colonial até o momento atual, traçaremos um paralelo de como culturas consideradas minorias, e a arte da capoeira como cultura subalterna, conseguiram sobreviver, adaptar-se para não morrer.

Já em 1835, antes mesmo do Decreto Nacional de 1890 que proibia a prática da capoeira em todo o país, a capital paulistana já registrava de 25 a 30 açoites decorrentes da prática da capoeira, no Largo dos Aflitos, onde hoje se encontra a Praça da Liberdade, e onde, para o assombro de muitos, era o Pelourinho da Capital. Sim a Capital tinha um Pelourinho, e o nome Aflitos, dava-se ao cemitério que se encontrava ao lado, onde até hoje se encontra a Capela das Almas Aflitas.

Basicamente a capoeira paulistana se divide em três períodos. O primeiro, A Capoeira Escrava, é da época do fluxo de escravos provindos da Bahia trazidos para os canaviais paulistas, e a influência dos quilombos de Pai Felipe e do Jabaquara, ambos na baixada santista, na capital. O mais importante a ressaltar certamente é uma seqüência de manuscritos sobre a proibição da capoeira na capital. O primeiro deles é assinado pelo Presidente da Província, Antônio Joaquim Xavier da Costa. O documento encontrado por nossa equipe de pesquisa, que data de 17 de novembro de 1832, proíbe a prática do jogo de escravos conhecido vulgarmente como capoeira na capital.

Uma nova Postura Municipal se atrela a essa última com data de 11 de março de 1833, determinando de 25 a 50 açoites, ainda pagando 3 mil réis de multa, para aqueles que desobedecessem a postura. Em 15 de novembro de 1834 novamente o Presidente da Província, então Excelentíssimo senhor Thobias de Aguiar, faz um novo manuscrito onde reclama da continuidade de pessoas jogando capoeira nas vias da capital.

Esses fatos ilustram a resistência da repressão na cidade, a manifestação e a expressão do povo negro, quiçá de ex-escravos.

O segundo período A capoeira e o Samba, revela que a cidade de São Paulo não é e nem nunca foi o túmulo do samba e muito menos da capoeira. Nas décadas de 30 e 40 as lutas regionais de resistência na cidade eram conhecidas por pernada e tiririca. Em cada canto da cidade existia um foco. No Bexiga era a turma de Patro N´Agua, no Largo do Peixe no Tatuapé era o Senhor Nenê de Vila Mathilde. Na Praça da sé eram os engraxatres da tiririca, Osvaldinho da Cuíca, Germano Mathias. No Largo da Banana, hoje Barra Funda, eram os estivadores vindos de Santos. Dentre os inúmeros anônimos que fizeram parte dessa história estão Osvaldinho da Cuíca, Senhor Nenê de Vila Matilde, Germano Mathias, Toniquinho Batuqueiro, Pato n´Agua, Paulo Cunha, entre outros.

Essas comunidades do samba, hoje conhecidas como “Escolas” se encontravam no Largo do Paissandu, onde fica a Igreja Nossa Senhora dos Homens Negros. Plínio Marcos também era freqüentador do Paissandu. Era ali que entre um copo e outro, escolhia capoeiras para suas peças de teatro e para o circo. Espetáculos folclóricos montados por Solano Trindade com capoeiras como Ananias (BA) e Paulo Cunha (SP) também eram exibidos ali ao lado na Galeria Olido.

O terceiro e último período, A chegada dos grandes baianos, começa com a visita de Mestre Bimba a cidade de São Paulo em fevereiro e março de 1949 para demonstrações públicas no Estádio do Pacaembu. Manoel dos Reis Machado, conhecido como Mestre Bimba, foi o baiano que criou a capoeira hoje popularmente chamada de capoeira regional, e que conseguiu do então Presidente Getúlio Vargas, a autorização para a prática da capoeira, tirando-a do código penal. As apresentações de Bimba lotaram por uma semana o Estádio do Pacaembu e sua passagem pela capital foi amplamente coberta pela imprensa. Bimba parte de São Paulo após receber uma proposta para que a capoeira enfrentasse a luta livre, muito em voga na época. Bimba aceita, mas só se for pra valer. Na real. Os produtores então, que queriam uma marmelada insistem, e Bimba que era homem de palavra, vai embora e faz o jogo duro na cidade do Rio de Janeiro.

Posteriormente à visita de Mestre Bimba, começam a chegar na capital, grandes capoeiras baianos como os Mestres, Suassuna, Ananias, Limão, Silvestre, Brasília, que divulgam amplamente a modalidade e propagam a prática da capoeira em academias fechadas, além de levá-la de São Paulo para o mundo. Esses baianos instalados na capital criam um verdadeiro consulado informal da Bahia. Tornam-se referência para a comunidade e para outros capoeiras. Passam por dificuldades e alguns chegam a São Paulo em plena época de ditadura militar como Mestre Suassuna de Itabuna. Essas pessoas fizeram através da capoeira, uma ampla divulgação da cultura, da culinária, dos termos de linguagem, dos costumes e transformaram São Paulo em uma plataforma para a divulgação da capoeira para o exterior.

Assim como São Paulo traz uma mistura de paulistanos e nordestinos, baianos e mineiros, ricos e pobres, a capoeira a todos une sem distinção, proporcionando a agradável sensação de liberdade e valorização da auto-estima. Em uma roda de capoeira, o pedreiro baiano pode jogar com o médico paulistano, o intelectual baiano pode jogar com o menino analfabeto da favela. Essas qualificações deixam de existir ao momento do toque do São Bento Grande. Na roda de capoeira, o Mestre, quem comanda, é o berimbau e só ele, é capaz de distinguir quem está na roda.

Esses anônimos, estivadores, engraxates, sambistas, compositores têm uma paixão única: brincar com o corpo ao som de música. São verdadeiros ícones da memória paulistana e a história de cada um, mesmo dos grandes Mestres baianos na cidade, nunca foi explorada como se deve simplesmente por causa do regionalismo: estamos falando de São Paulo. Um contraponto para uma cidade que é considera pólo cultural do país.

Do tempo em que São Paulo ainda tinha chão de terra batida, capoeiras de matos ralos e arraiais ao invés de arranha-céus, criaremos um paralelo com as grandes periferias, cortiços, mostrando os anônimos que hoje tiram as crianças e jovens do crime através da capoeira como disciplinadora e educadora.

Resgatar essas histórias, essas pessoas, esse passado e contá-lo para a posteridade é mais do que uma necessidade, é um verdadeiro prazer. São Paulo e seu povo, e aqueles que foram imprescindíveis na construção da cidade e de sua identidade multi-racial e multi-cultural, merecem esse reconhecimento.

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Puxada de Rede




O teatro folclórico que retrata a puxada de rede, conta a história de um pescador que ao sair para o mar em plena noite para fazer o sustento da
família, despede-se de sua mulher que, em mau pressentimento, preocupa-se com a partida do marido e o assusta dizendo dos perigos de sair à
noite, mas o pescador sai e deixa-a a chorar, e os filhos assustados.
O pescador sai para o mar e leva consigo uma imagem de Nossa Senhora dos Navegantes, seus companheiros de pesca e a bênção de Deus.
Muito antes do horário previsto para a volta dos pescadores, que seria às cinco horas da manhã, a mulher do pescador, que ficou na praia esperando a hora do arrasto, teve uma visão um tanto quanto estranha. Ela vê o barco voltando com todos à bordo muito tristes e alguns até chorando. Quando os pescadores desembarcam, ela dá pela falta do marido e os pescadores dizem a ela que ele caiu no mar por conta de um descuido e que devido à escuridão da noite, não foi possível encontrá-lo, ficando ele perdido na imensidão das águas.
Ao amanhecer, quando foram fazer o arrasto da rede que ficara no mar, os pescadores notaram que por ter sido aquela uma noite de pouca pesca, a rede estava pesada demais. Ao chegar todo o arrasto à praia, já com dia claro, todos viram no meio dos poucos peixes que vieram, o corpo do
pescador desaparecido. A tristeza foi instantânea e o desepero tomou conta de todos ali presentes.
Prossegue-se então os rituais fúnebres do pescador sendo levado à sua morada eterna pelos amigos que estavam com ele no mar, sendo seu corpo carreagado nos ombros, pois a situação financeira não comportaria a compra de uma urna, o cortejo segue pela praia.